Recomendação sobre uso de androgênios e câncer de mama

A Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM) vê com grande preocupação o uso crescente de testosterona e seus derivados sintéticos pela população feminina no País.

A utilização de androgênios associada à incidência de câncer de mama, assim como à evolução da doença, é desconhecida. Porém, conceitos teóricos nos levam a ponderar sobre o possível aumento de risco e piora da doença.

As informações, disseminadas especialmente em redes sociais, sobre a possível segurança e os efeitos terapêuticos destes hormônios são baseadas em conceitos falsos ou análises incompletas do assunto, podendo culminar em danos irreparáveis à saúde.

De acordo com estimativa da Sociedade Brasileira de Endocrinologia, 1,6% das mulheres recebem recomendações para uso de hormônios masculinos. As indicações são múltiplas, incluindo benefícios estéticos.

A reposição de testosterona é claramente recomendada em diagnósticos de hipogonadismo masculino e nas terapias para redesignação sexual em homens transgêneros. O uso em mulheres para fins estéticos é controverso e contraindicado por agências reguladoras de diversos países, inclusive pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

A SBM ressalta que não existem estudos com alto rigor científico (ensaios clínicos randomizados) que avaliem de maneira precisa o risco de câncer de mama relacionado ao uso de hormônios masculinos.

No entanto, os androgênios têm potencial para aumentar o risco de câncer de mama através de dois mecanismos: (i) estímulo direto de receptores androgênicos, presentes em alguns tipos de tumor mamário; (ii) transformação do androgênio em hormônio feminino (estrógeno), através da conversão periférica mediada pela enzima aromatase e estímulo direto a receptores estrogênicos, presentes na maioria dos casos de câncer de mama.

Mesmo diante da limitação de pesquisas, alguns estudos já demonstram maior incidência de câncer de mama em mulheres com níveis androgênicos séricos elevados ou pessoas que receberam terapia hormonal androgênica para redesignação sexual.

Sendo assim, a Sociedade Brasileira de Mastologia conclui:

  1. Diante da falta de estudos que atestem segurança para o uso de hormônios masculinos, e tomando-se por base potenciais riscos teóricos, recomenda-se que mulheres com câncer de mama não utilizem androgênios exógenos.
  2. A princípio, a mesma conduta deve ser sugerida a mulheres com alto risco para a doença.
  3. O uso desta medicação em mulheres com baixo risco para câncer de mama, ou seja, a população em geral, pode aumentar o risco de desenvolvimento da doença. A utilização deve se restringir a situações necessárias, sob rigorosa supervisão médica e após ampla discussão com a paciente.
  4. Informações sobre a ausência de riscos ou possível proteção mamária através do uso de androgênios, da forma como vêm sendo apregoadas na mídia e em redes sociais, são incorretas, e com base nos dados científicos atuais, não devem ser repassadas à população.

Referências Bibliográficas

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