Mamografia: entidades e ministério divergem sobre idade mínima para exame de rotina; veja como funciona

Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos EUA sugeriu que paciente com risco médio para câncer de mama faça mamografias regulares a partir dos 40 anos, e não mais dos 50. No Brasil, orientação é para quem tem entre 50 e 69 anos, mas entidades médicas discordam dessa recomendação.

Pesquisadores norte-americanos querem diminuir a idade mínima para fazer a mamografia de rastreamento, exame de rotina para mulheres sem sintomas de câncer de mama. Nesta semana, a Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos sugeriu que pacientes com risco médio para a doença devem começar a fazer mamografias regulares a partir dos 40 anos, e não mais dos 50.

📊 Contexto: A revisão nas recomendações veio após um aumento no número de diagnósticos de câncer de mama em mulheres mais jovens – um cenário que não é exclusivo dos Estados Unidos.

Os casos de câncer de mama no Brasil também cresceram nos últimos anos, se alastrando por todas as faixas etárias, incluindo as mais jovens. Mais de 73,6 mil casos novos da doença podem ser diagnosticados neste ano, segundo estimativa do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

No Brasil, as diretrizes do Ministério da Saúde indicam a realização da mamografia em duas situações: para rastrear ou para diagnosticar (ou não) o câncer de mama.
👉 1 – A mamografia de rastreamento é voltada para mulheres de 50 a 69 anos, com um intervalo de até dois anos entre um exame e outro. É recomendado para pacientes assintomáticas que, nessa faixa etária, fazem o exame para identificar possíveis lesões na mama que possam ser um câncer.

📝 Segundo o Inca, a maior parte dos casos de câncer de mama ocorre a partir dos 50 anos. As evidências científicas mostram que o rastreamento nessa faixa etária pode reduzir mortes.

👉 2 – A mamografia de diagnóstico é voltada para mulheres com sinais de câncer de mama, como caroços endurecidos, fixos e sem dor, ou mudança no mamilo. Nesse caso, pode ser feita em qualquer faixa etária com indicação médica e também em homens com sintomas da doença.

🧬 Quem tem histórico de câncer de mama ou de ovário na família também podem fazer mamografia em qualquer idade, com ou sem sintomas. A recomendação é de que pacientes nessas condições conversem com o médico para avaliar os riscos e a conduta a ser seguida.

Entidades médicas brasileiras divergem da orientação nacional e tentam há anos reduzir a idade mínima para a mamografia de rastreio, conduzindo a mesma discussão pautada nos Estados Unidos.

🎗️ Mulheres sem sintomas de câncer de mama devem fazer mamografia de rotina a partir dos 40 anos, uma vez ao ano, segundo a Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM), a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR).

Os dados mostram que 25% das mulheres com câncer de mama no Brasil desenvolvem a doença entre 40 e 50 anos. Por isso, existe essa divergência em termos de idade para o início do rastreamento mamográfico.
— Rosemar Rahal, médica mastologista da diretoria da SBM

O que diz o governo

Segundo o Inca, a recomendação do exame rotineiro para a faixa etária de 50 a 69 anos é baseada em estudos clínicos que acompanharam mulheres ao longo dos anos e que mostraram que não há benefícios em antecipar a mamografia de rotina.

🔄 Uma mudança nessa orientação só seria viável se novos estudos, feitos em vida real e não somente com dados teóricos, mostrarem que a eficácia de fazer mamografia a partir dos 40 anos.

“No Brasil, não há estudos clínicos desta forma, mas há em outras partes do mundo. Nós acompanhamos as evidências, avaliamos a qualidade dos estudos e, com base nisso, fazemos as recomendações”, disse ao g1 Arn Migowski, médico sanitarista e epidemiologista, chefe da divisão de detecção precoce e apoio à organização de rede do Inca.

Essa é apenas uma recomendação ministerial. Ou seja: não é proibido fazer mamografia em mulheres abaixo dos 50 anos que não tenham sintomas de câncer de mama.

“É permitido, o SUS paga. É bom para a mulher? A gente acredita que não. Pelas melhores evidências disponíveis atualmente, a gente acredita que não seja bom fazer”, explicou Migowski.

Em 2021, foram realizadas 3.497.439 mamografias em mulheres no SUS. A maioria – mais de 3,1 milhões – foram mamografias de rastreamento. Dessas, 2,05 milhões foram feitas em mulheres entre 50 e 69 anos (público-alvo) e 862,7 mil na faixa etária de 40 a 49 anos.

O que é a mamografia?

É o raio X das mamas. Apesar de causar desconforto temporário (e, em alguns casos, doer), pois comprime as mamas em um aparelho chamado mamógrafo, o exame é essencial para detectar alterações, como nódulos ainda não palpáveis que podem indicar o início de um câncer de mama.

A confirmação da doença é feita com uma biópsia. O câncer de mama tem tratamento, que pode ser menos agressivo e mais efetivo se detectado de forma precoce.

👩 O risco de desenvolver a doença aumenta com a idade, principalmente dos 50 anos para cima. Por isso, a estratégia do SUS é voltada para reforçar a realização da mamografia a partir dessa idade, já que a cobertura brasileira do exame de rastreio está abaixo dos 70%, porcentagem recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

👨 Homens também podem ter câncer de mama, mas o grupo representa apenas 1% de todos os casos. Em 2021, foram feitas 7.281 mamografias em homens para fins diagnósticos no SUS.

Qual a idade mínima para fazer a mamografia de rotina?

A orientação do Ministério da Saúde e do Inca é para que mulheres de 50 a 69 anos que não possuem sinais ou sintomas de câncer comecem a fazer a mamografia a cada dois anos. O objetivo é rastrear possíveis alterações nas mamas que são imperceptíveis para a paciente, mas não escapam do exame.

❌ De acordo com o Inca, antes dos 50 anos, as mamas são mais densas e com menos gordura, o que limita o exame e pode gerar resultados incorretos. Já na faixa etária acima dos 70 anos, o risco da mamografia revelar um tipo de câncer de mama que não causaria danos à mulher é maior.

✅ O benefício de antecipar a idade mínima para 40 anos é a possibilidade de encontrar um câncer de mama no início e passar por um tratamento menos agressivo e com maior chance de cura.

Para a mastologista Rosemar Rahal, o benefício de se fazer a mamografia de rotina mais cedo e de forma frequente é maior que o risco.

Se eu considerar que 25% das pacientes tiveram câncer de mama entre 40 e 50 anos, a partir de 50 anos eu vou ter um número maior de diagnósticos. Provavelmente, o que o Ministério da Saúde faz é focar nessa população que vai ter uma frequência maior da doença. Entretanto, 25% da população que teve câncer de mama e está entre 40 e 50 anos fica negligenciada.
— Rosemar Rahal, mastologista e diretora da Sociedade Brasileira de Mastologia (SBM)

Já o Inca considera o contrário: em mulheres fora da faixa entre 50 e 69 anos, as mamografias de rotina provavelmente não trarão benefícios – e os riscos serão ainda maiores.

🚨 Um dos principais pontos levantados pelo órgão é o alarme falso: o resultado pode dar falso-positivo – e deixar a paciente ansiosa e estressada – ou falso-negativo, dando uma errônea sensação de segurança à mulher.

O instituto ainda afirma que o exame feito em mulheres mais jovens pode mostrar lesões na mama que não vão evoluir para um câncer, gerando sobrediagnóstico e o sobretratamento.

“O que acontece hoje é que não conseguimos saber qual lesão, uma vez diagnosticada, vai ou não evoluir para um câncer de mama. Por isso, nós consideramos que a mamografia traz muito mais benefícios do que riscos”, rebateu a médica Rosemar Rahal.

Mulheres que queiram fazer a mamografia, mesmo fora do público-alvo e sem sinais de câncer, devem procurar ajuda de um médico para tirar as dúvidas e tomar uma decisão compartilhada.

“A mulher procura o serviço de saúde e, com o médico, compartilha essa decisão de fazer ou não a mamografia. Uma decisão consciente e compartilhada, não há problema nenhum [em fazer a mamografia]. É um direito da mulher”, disse o médico do Inca Arn Migowski, afirmando que não há comprovação de que antecipar a mamografia possa salvar vidas.

Para além da mamografia, a mulher deve estar atenta às modificações do corpo, segundo Migowski. E, em caso de qualquer mudança, buscar os serviços de saúde.

“Não é só aquele método-padrão de autoexame. É se questionar: ‘como a minha mama é normalmente?’. Aí ela pode apalpar a mama e observá-la em situações cotidianas, como na hora de tomar banho. Isso é uma autoconscientização sobre a mama. Ao se conhecer, ela saberá o que é um sinal de alerta”, disse.

⬇️ No final desta reportagem, você confere os principais sinais de câncer de mama e outras informações sobre a doença.

Para a médica Rosemar Rahal, a questão envolvendo a mamografia no Brasil também passa pela gestão da saúde. Segundo ela, é necessário que a paciente tenha acesso a mamografias de qualidade, a informações sobre a importância do exame e realização da biópsia, em caso de detecção de lesão.

“Isso é um grande gargalo hoje no Brasil: confirmar se aquilo é ou não é câncer”, afirmou a mastologista. “Nosso problema não é falta de mamógrafo. A questão é a paciente ter acesso em vários aspectos, como a uma indicação médica, principalmente entre aquelas que evitam a mamografia por medo do próprio exame ou do diagnóstico”, disse Rosemar Rahal.

↪️ O Brasil contava com 6.642 mamógrafos em maio de 2022 – 6.377 em uso. O número de estabelecimentos com mamógrafo no SUS era de 2.932. Esse é o dado mais recente.

↪️ Já a qualidade da mamografia é voltada para eficiência do diagnóstico. Um programa do governo federal monitora o funcionamento dos mamógrafos no SUS e a interpretação dos exames, além da conduta de profissionais de saúde. O objetivo é que a sensibilidade dos exames fique entre 85% a 90%, o que permite a detecção até de tumores pequenos e de baixa densidade.

Entre 2017 e agosto de 2021, o Programa de Qualidade em Mamografia do Inca avaliou 1.112 processos na primeira fase – desses, 85,7% foram aprovados.

Câncer de mama é mais agressivo em jovens?

Depende, de acordo com a médica Rosemar Rahal. O câncer de mama pode ser mais agressivo em qualquer faixa etária. Mas há estudos que mostram que tumores que crescem de forma rápida são mais comuns em pacientes abaixo dos 50 anos que “herdam” a doença.

O que nos chama atenção é que as pacientes que têm alguma mutação, ou seja, uma pré-disposição familiar para o desenvolvimento do câncer de mama, podem ter o que a gente chama de tumor de intervalo, que cresce de forma rápida e é mais agressivo. Esses tipos de tumores tendem a aparecer com maior frequência nas pacientes abaixo das 50 anos.
— Rosemar Rahal, mastologista

⚠️ Segundo o médico Arn Migowski, a mulher deve ficar atenta ao seguinte histórico de casos na família:

  • Caso de câncer de mama em homem;
  • Caso de câncer de ovário em mulher;
  • Caso de câncer de mama na mãe, filha ou irmã (principalmente em mulheres jovens).

Nesses casos, a mulher pode fazer a mamografia em qualquer idade, com ou sem sintomas. Mas a decisão deve ser tomada de forma conjunta com o médico, que pode direcionar o melhor caminho.
Entre 10% a 15% dos casos da doença estão relacionados a fatores como pré-disposição familiar, como alterações genéticas herdadas da família, especialmente nos genes BRCA1 e BRCA2.

🎗️ Saiba mais sobre o câncer de mama 🎗️

O que é o câncer de mama? É uma doença resultante da multiplicação de células anormais da mama, que forma um tumor com potencial de invadir outros órgãos. A maioria dos casos tem boa resposta ao tratamento, principalmente quando diagnosticado e tratado no início.

O câncer de mama é comum no Brasil? Sim. É o tipo mais comum, depois do câncer de pele, e também é o que causa mais mortes por câncer em mulheres. Em 2020, foram 17.825 óbitos.
Só as mulheres têm câncer de mama? Não. Homens também podem ter câncer de mama, mas isso é raro (apenas 1% dos casos).

O que causa o câncer de mama? Não há uma causa única. Diversos fatores de risco estão relacionados ao câncer de mama. Entre eles, comportamentais (obesidade e sedentarismo), história reprodutiva (uso de contraceptivos orais por tempo prolongado) e hereditários (alterações genéticas/histórico familiar de câncer de mama e ovário). A presença de um ou mais desses fatores de risco não significa que a mulher terá, necessariamente, a doença.

Quais são os sinais e sintomas do câncer de mama? A presença de um caroço (nódulo) endurecido, fixo e geralmente indolor é a principal manifestação da doença, estando presente em mais de 90% dos casos. Outros sintomas são: alterações no mamilo, pequenos nódulos na região embaixo dos braços (axilas) ou no pescoço, saída espontânea de líquido de um dos mamilos ou pele da mama avermelhada, retraída ou parecida com casca de laranja.

Qualquer alteração na mama pode ser câncer? Nem sempre. Os sintomas precisam ser investigados o quanto antes, mas podem não ser câncer de mama. Qualquer caroço na mama em mulheres com mais de 50 anos deve ser investigado. Em mulheres mais jovens, qualquer caroço deve ser investigado se persistir por mais de um ciclo menstrual.

Como as mulheres podem perceber os sinais e sintomas da doença? Todas as mulheres, independentemente da idade, podem conhecer seu corpo para saber o que é e o que não é normal em suas mamas. A maior parte dos cânceres de mama é descoberta pelas próprias mulheres. O Inca recomenda que a mulher olhe, apalpe e sinta suas mamas no dia a dia para reconhecer suas variações naturais e identificar as alterações suspeitas.

É possível reduzir o risco de câncer de mama? Sim. Manter o peso corporal adequado, praticar atividade física e evitar o consumo de bebidas alcoólicas ajudam a reduzir o risco de câncer de mama. A amamentação também é considerada um fator protetor.

Como ocorre o diagnóstico? Alterações suspeitas na mama podem ser avaliadas pelo exame clínico das mamas, que é a observação e palpação das mamas pelo médico, e pela radiografia das mamas. Caso a mamografia identifique algo suspeito, é feita uma biópsia para confirmação ou não da doença.

Como é o tratamento? Depende do estágio do tumor, o tratamento pode ser local, com cirurgia e radioterapia, além da reconstrução mamária, ou o tratamento sistêmico, com quimioterapia, hormonioterapia e terapia biológica.

Fonte: Inca.

Texto extraido do Portal G1 (https://g1.globo.com/saude/noticia/2023/05/20/mamografia-entidades-e-ministerio-divergem-sobre-idade-minima-para-exame-de-rotina-veja-como-funciona.ghtml)